domingo, 13 de dezembro de 2015

Cheganças



Sempre me fiz tempestade,
Furacão.
Meios termos nunca me encantaram.
Fazia do extremo meu lema,
Canção.

Mas aí chegou você!

De um jeito manso
Sendo sopro de leveza
Me acalmando o coração.

Me olhou de um jeito bonito
Estendeu a mão
Como quem tira para dançar
E, aos pouquinhos,
Fez do meu olhar
Tresloucado de paixão.

Me ensinou que o "para sempre"
É composto de"agoras"
E assim,
Bem de mansinho
Me fez querer ficar
Fazer do teu peito,
Meu ninho.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Conselhos a um menino fujão


            
Ei menino, senta aqui. Mesmo com a aparente distância entre nossos mundos, abre bem os ouvidos, me presenteia com esse olhar terno e escuta bem meus conselhos de mulher que parece ter conhecido cada detalhe do universo.
Quero que você saiba que mesmo muito diferentes, somos um tantinho igual - eu tenho um pouco dessa tua meninice: ainda me falta um bocado para crescer. Também preciso te contar que já percorri algumas estradas a mais que você e que elas não são tão doces quanto a nossa sintonia, mas que a gente vai colocando poesia nelas: independente do que te disser o resto do planeta, não esquece - quem dá o tom suave da vida é a gente.
Por vezes você vai tentar fugir dos problemas, assim como foge de mim e das minhas impossibilidades. Mas olha, por mais que seja difícil encarar, as coisas não são assim. É necessário enfrentar cada monstro que aparece no nosso meio, principalmente aqueles que tentam fazer latifúndio do nosso coração. Eu sei, eu sei. Dói. Parece que destrói cada pedacinho que nos compõe. Mas te garanto, se a gente ignora totalmente, menino, se a gente finge que não vê de jeito nenhum, tudo isso domina a gente de uma forma bem pior.
Também não deixa faltar poesia na tua vida. Você pode até achar isso bem estranho, coisa de gente grande eu falar tanto assim nela. Mas é não. Isso, menino, é pouco do que ainda resta de bonito da minha pequenez. Além do que, é essencial. Tudo já é tão feio. Se a gente não rima esses versos desengonçados que vai arrumando por aí, sei nem como se leva pra frente.
E por fim, menino, não se desapega do amor. Não deixa ninguém te dizer que ele é coisa besta, que a gente passa melhor sem ele. Nem que esse alguém seja eu. Sem sentir a gente nem existe. Não perde essa tua capacidade de transmitir paixão. Você nem sabe, mas todo esse amor que você exala, já me sustentou diversas vezes.
E para acabar mesmo, sem mais delongas e conversa furada, quero te pedir para não sumir tanto assim. Ok, ok. Posso te assustar e deixar pensando que é melhor não me olhar nunca mais. Só que o que existe entre a gente é maior que isso, pelo menos vez por outra, volta aqui. É que a serenidade da nossa tempestade me deixa tão feliz.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Dos tropeços que remedam



De tão desastrada que sou, topei em um amor bem pequenininho e quebrei metade de mim. 
Tentando desviar para não levar outro tombo em uma baita ilusão que me aparecia à frente, escorreguei e quebrei a outra metade que me restava.
Quebrando-me, então, em metades e várias migalinhas fiquei inteira!

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Para um moço de poucas palavras



É moço, logo eu que sempre fui dada à palavras, que sempre gostei de prosear. Logo eu que falo tanto, fico muda assim, só de te olhar. 
Quando me boto na tua frente, sei o que dizer não. Só sei olhar para o pretume dos teus olhos e me embriagar com esse cheiro de amor novo que exala quando a gente se abraça.
Fico querendo procurar palavras certas e bonitas, mas de bonito só tem o que tá nascendo bem de mansinho. 
E nem me pergunte nesse teu silêncio cheio de mistério o que é que tá brotando aqui dentro. Nessa minha ignorância de quem parece amar pela primeira vez - mesmo já tendo o coração remendado por demais - também não sei do que se trata. 
Mas tô preocupada também não. A tal da pressa em descobrir exatamente o que é finalmente me deixou em paz. 
Não se avexe não, seu moço. Vamos deixar essas palavras desarrumadas para lá, prefiro só sentir. 

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Adeus, pequeno



Vem, pequeno. Não se acanhe, pode entrar, você já é de casa. É, eu sei, deve tá tudo estranho para você. Para mim também tá. Sei que essa organização aqui dentro deve aparentar uma bagunça enorme e bizarra, acredite - eu também não tô conseguindo encontrar nada por aqui. Sei, não dá para entender essa falta de intensidade, né? É incompreensível toda essa calmaria e inadmissível tamanha serenidade. Antes de você ir eu era só exagero e agora o meio termo se familiarizou e fez morada por aqui.
Mas é que quando você decidiu que era de hora de partir você levou muito de mim. Deixou só aqui um ser que não sabia lidar com todo aquele sentimento, que não conseguia engolir tamanha solidão e que não tinha ideia do que fazer com tantas lembranças e com o vazio enorme que você provocou.
Não foi fácil, pequeno. Nenhum pouco, para ser sincera. É que quando você chegou eu acreditei muito em você, em nós e nesse tal de amor. Mas não foi dessa vez, não para mim. Eu entendo, pequeno. Entendo que não foi de propósito. Tenho certeza de que você não me despedaçou por querer e que seu silêncio me pede desculpas vazias de remorso. E sem querer também você levou muito do que eu tinha de melhor e abandonou por aí, em uma esquina qualquer.
Quando você resolveu seguir seu rumo, junto contigo foi toda aquela minha esperança, aquela capacidade que eu tinha de sonhar. Você fez o desfavor de me apresentar uma tal de realidade e de me roubar o resto da ilusão que tinha no pote escondido no fundo armário. Também foi dentro da tua mala seca aquela minha intensidade ansiosa, as borboletas que meu estômago aprisionava se soltaram e agora só me acompanha um enjoo amargo de tranquilidade.
Você me levou isso e muito mais. Levou embora de mim aquilo que eu era e me obrigou a remexer tudo que tinha aqui por dentro. Sua partida me forçou a mudar de lugar a organização dos meus sentimentos. Fiquei um pouco dura, sabe. Tive que engolir junto com a saudade o fel da vida real. Eu desaprendi a me jogar, pequeno. A indiferença veio ser companheira minha, sem me deixar reconhecer quem sou. Tive que me refazer e acabei deixando tudo arrumado demais.

domingo, 11 de outubro de 2015

Reencontros



Por culpa dos encontros da vida - que muitas vezes resultam em desencontros - a gente vai se esbarrar. Talvez você esteja com uma menina de riso mais branco e fácil que o meu ou talvez eu realmente te encontre por aí de mãos dadas com a solidão. A gente vai rir um para o outro, mas não vamos nos encarar. Nossos olhares falam demais e podem, quem sabe, exigir os 'porquês' daquele final escandalosamente silencioso. Ou pior ainda, podem cogitar uma volta de, pelo menos, algumas horas.
Vamos cumprir nosso papel de bons amigos. Você vai me perguntar como anda a faculdade e me contar o quanto é difícil encarar a fase final de curso/vida adulta-profissional. Vai fazer piada com sua própria situação e vai me dizer, enterrando os olhos no chão, que quando for a minha vez, eu vou tirar de letra. Meio que se desculpando por ter largado minha mão quando eu mais precisava. Eu vou falar que você logo, logo vai encontrar o sucesso e, em ritmo de brincadeira, ser sincera contigo dizendo que quando ele entrar pela sua porta, você vai se esquecer de mim. Vou te contar dos rebolados que tenho dado para equilibrar o tempo e dar conta do monte de tarefas que tenho. Vou te falar da minha pesquisa e de como ela vai salvar o mundo. 
Os assuntos vão terminar e para não perdermos a postura de pessoas bem resolvidas e desapegadas vamos propor uma cerveja e procurar o bar mais próximo. Ao sentar a mesa meu coração vai batucar e temer ser escutado, ao especular a possibilidade de o seu também balançar só um pouquinho por mim. Vou tremer as pernas para tentar mascarar o som do meu peito e, pela força de um hábito já perdido, você vai colocar a mão no meu joelho para que eu pare, questionando se eu ainda tenho todo aquele problema com ansiedade. 
Eu vou tentar rir, dizendo bem caladinha, como ainda sou a mesma pessoa e o quanto eu sinto falta dos teus cuidados. Vou abrir a boca para te lembrar que nem faz tanto tempo assim, que eu ainda nem consegui colocar aquele livro que você leu para mim no lugar que ele ocupava na estante e que minha vida ainda está cheia de poesia tua.  Mas aí vou lembrar que você vive minutos como eternidades e vou suspirar baixando a cabeça. 
Você vai perguntar se tudo anda bem, se eu me interesso pelos teus conselhos e se você pode me oferecer ajuda. Vou querer correr pro teu colo conhecido e curar nos teus braços as feridas que você me causou. Mas vou só dizer que foi um dia corrido e te contar alguns problemas do trabalho. Você vai me dar conselhos experientes de quem pouco conhece o mundo; eu não vou contra argumentar e vou elogiar teu poder de resolver tudo aquilo que não nos diz respeito. 
Já movidos por algum teor alcoólico vamos relembrar a nossa velha mania de devanear a respeito da vida e teorizar sobre aquilo que só se sente. Lá pelas tantas, em um momento de alto risco, vamos tocar em um passado comum, querendo fingir que não dividimos nada além de mesa de bar. Vamos tocar em coisas que se perderam e ainda se fazem presentes no nosso cotidiano. Vou querer te dizer da falta que você me faz, do quanto me controlo para não te procurar e de como a vida anda feia sem você. Vou ficar imaginando que você também quer me dizer algo do tipo, alimentando uma expectativa que me corrói. Vou querer te chamar para minha casa e de volta pra minha vida.
O silêncio constrangedor de segundos que aparenta te trazer um remorso inexistente vai fazer você olhar para o relógio. Mas antes que você se proponha a partir novamente e que me deixe outra vez na solidão da minha companhia, eu me adianto e digo que já está tarde. Você acena para o garçom, pede a conta e  a saideira do nosso amor. 

sábado, 10 de outubro de 2015

Sobre o amor e uma menina desastrada



Sei que se apercebeu desde cedo que me componho toda de desastre, você até ria e tirava brincadeira com isso. Sempre que eu derrubava qualquer objeto, caía ou conseguia me queimar, você zombava me pendido cuidado. Rogava que eu tivesse mais atenção, que olhasse para os lados, para frente e tentasse não pisar tanto em falso. Pedia para eu não me machucar porque era cuidando de mim que eu cuidava de você.
Mas além de desastrada eu sou boba. Mesmo transparecendo maturidade e experiência, sou só uma menina medrosa, já te disse. Uma menina medrosa muito fácil de ser enganada, em especial se for por mim mesma.
E mesmo diante de tantos pedidos, de tantas alertas eu não soube me cuidar. Não soube nos cuidar. E além de ralar os joelhos e arrancar tampos dos dedos em topadas que a vida nos apresenta, eu ensanguentei esse amor. Meu desastre que quebra tudo aquilo que se põe ao meu alcance foi maior que teus apelos de calma e atenção, eu consegui estragar tudo, pequeno. Com a minha pressa desastrosa eu derrubei esse amor, pisando em cima dele sem perceber e deixando-o em migalhinhas. Não tinha outra saída, eu sei. Frente a tanto desastre não tinha como ficar perto: ou você se afastava ou eu ia acabar te quebrando também.
Agora, fico só te olhando de longe. Fico só a te observar ser vitoriosamente e lindamente inteiro. Doida de vontade de te pedir ajuda para colar tudo aquilo que eu despedacei. Mas eu tenho que crescer, tenho que aprender a concertar aquilo que eu teimo destruir. Sendo assim, tenho de aceitar: esse amor não se cola mais.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Sobre dar certo



Quando pressenti o fim se colocar entre a gente, se abriu um buraco no meu peito e eu deixei que escorresse um choro manso e doído, agarrada ao travesseiro que tinha teu cheiro. Chorava e repetia para o meu coração já quase vazio o quanto eu queria que desse certo com você.
Sofri durante dias, amaldiçoando a vida por ter tirado essa possibilidade de mim. Mas tem uma hora que a gente enfrenta a realidade. E quando bati de frente com ela, me surpreendi: vi que a gente tinha dado certo. A verdade, meu rapaz, é que logo eu - que tanto me questiono buscando respostas - nunca tinha pensado sobre o que é dar certo. 
Como de costume, cheguei a minha resposta pela negativa daquilo que procuro. E dar certo, menino, não é status no facebook, nem datas escolhias e, muito menos, o tal do "para sempre". Dar certo é muito mais que isso. É conseguir fazer sorrir no meio de uma quinta-feira problemática, é ser testemunha de choros escandalosos guardados para a madrugada. É sentir compreensão em uma troca de olhar, é ser companhia mesmo quando distante. Dar certo é poder confiar, é não sentir vergonha, é poder contar, é rir da piada sem graça, é dividir as dores do que passou e o medo do que vem. Dar certo é se querer bem, é torcer pelo bem do outro. Não se liga a temporalidade, mas muito a intensidade. 
E essas coisas todas a gente teve de sobra. É, a gente deu tão certo. 

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

Porque eu sou feminista

Dia desses me fizeram uma pergunta aparentemente fácil de se responder: "por que você é feminista?" . Confesso - pensei por muito tempo até chegar a conclusão do porque ter o feminismo como guia da minha vida. E conclui que sou feminista porque quando eu nasci disseram que a minha cor era róseo, mesmo que eu sempre tenha gostado bem mais de verde. Porque quando eu era criança diziam que eu tinha que brincar de boneca e fingir cuidar de casa, por mais que adorasse jogar bola. Porque quando me deparei com a primeira menstruação, tentaram me ensinar a ser mocinha e me contaram que eu deveria aprender a sentar de pernas fechadas, a me preservar mais e a me portar como moça de família.
Eu sou feminista porque me disseram que as tarefas domésticas eram inteiramente de minha responsabilidade, mesmo que vários homens morassem na mesma casa que eu. Eu sou feminista porque separaram mulheres em "para casar" e "para comer", e eu jamais iria querer ser mulher de uma noite só, tinha de aprender a ser "mulher para casar".
Eu sou feminista porque me fizeram acreditar que era feio mulher xingar, beber,  ficar com vários em uma noite ou ter comportamentos estritamente masculinos. Porque desde a adolescência me disseram que eu tinha que me dar o respeito e me negaram o que era meu por direito.
Eu sou feminista porque o sucesso profissional que eu tenho ou venha a ter é muitas vezes atribuído a "favores" sexuais prestados aos meus superiores, a roupa que usei na entrevista, mas nunca ao meu intelecto. Eu sou feminista porque minha avó ganhou menos que seus colegas de trabalho, minha mãe ganha menos que seus colegas de trabalho e eu ganho menos que os meus. Porque na sala de aula, em espaços políticos e em casa os homens da minha vida sempre me cortaram a fala. Porque eles sempre traduzem o que eu digo e sempre sabem qual a melhor hora para que eu fale.
Eu sou feminista porque quando estou em uma festa sempre tem um cara que só me respeita se eu estiver acompanhada e que sempre vai se desculpar pela insistência inoportuna com meu companheiro e não comigo. Porque não posso sair com a roupa que eu desejo sem ser julgada por isso. Porque o meu decote e o comprimento dos meus shorts legitimam as agressões verbais, físicas e psicológicas que eu sofro. Eu sou feminista porque não posso sair sozinha a noite, já que para mim o mundo é perigoso. Porque se eu for estuprada e se eu apanhar, foi tudo porque eu dei motivo, porque eu mereci.
Entenda, eu não queria ser feminista. Não mesmo. Mas eu precisei. Eu PRECISEI porque todos os dias minhas irmãs são violentadas, agredidas e mortas. E junto com elas eu morro um pouquinho, todos os dias.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Não sei



Se sei quem sou?
Sabe lá!
Quem define e traduz um punhado de incertezas?

Se me encho de "não sei's" não é a toa
Realmente não sei se conheço aquilo que desejo

Não sei se quero
Se arrisco
Ou se espero

Não sei se aposto
Se jogo
Ou se volto

Não sei se falo
Me faço
Ou me calo

Sei menos ainda
Se aqui pra você tem espaço!

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

As vantagens de ser invisível: uma resenha ou meu último aprendizado


Querido Charlie,

Queria começar dizendo que muitas vezes eu também sou invisível. E que talvez todas as pessoas boas, de alguma forma, o sejam. Isso não significa, no entanto, que  eu me ache uma pessoa tão boa assim. Muito pelo contrário. Mas eu tenho esperança. Tenho esperança de um dia ser como você.
Olha, eu também tenho as minhas feridas, que parecem nunca cicatrizar. Também escondo coisas irreveláveis (que um dia vão ser descobertas). Também não gosto das belezas convencionais. Na verdade, de nada que se enquadra nos padrões. 
Mas principalmente, Charlie, eu também penso muito, e-x-a-g-e-r-a-d-a-m-e-n-t-e. E sinto tantas coisas, de forma tão intensa; e nunca falo sobre elas. Eu também amo demais e tenho a mesma ilusão de que esse amor pode justificar tudo, sendo suficiente para qualquer coisa. Mas não é. E aí cometo o mesmo erro: acabo esquecendo de "fazer coisas". E a Sam tem toda a razão: a gente não pode se limitar a ficar sentado, sentir e pensar - "fazer coisas" importa muito.
E é por isso, é por você, Charlie; na verdade, foi com você que decidi parar de "não fazer coisas" e de tentar não ter tanto medo assim. 
Preciso também dizer que pela primeira vez eu não corri para última página logo nos primeiros capítulos de um livro. Pela primeira vez, eu não me deixei tomar pela ansiedade e pelo pavor do que estar por vir. E quer saber? Não vou mais querer ler o próximo capítulo da vida também. Deixa acontecer.
Com você e sua páginas eu tive muitas lições. E pode ter certeza de que, daqui por diante, vou estar sempre "fazendo coisas", amando e passando por túneis - deixando o vento bater no rosto.
Obrigada, Charlie. Aprendi a viver um pouco mais com você.


Com amor, 
Gabi.


OBS: ao terminar a leitura de "As vantagens de ser invisível" de Stephen Chbosky, tentei fazer uma resenha. Mas tudo o que saiu foi uma carta cheia de emoção para um dos personagens mais lindos que já (re)conheci. E a frase da foto 'somos infinitos' é uma das constatações mais loucas e profundas que Charlie fez. 

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Aquilo que não se publica em jornais



Hoje me deu uma vontade tremenda de te encontrar. E nem era para dizer que ando sentindo uma saudade desgraçada e que ainda penso muito em ti. Eu só queria te olhar nos olhos e contar que eu venho conseguindo estudar mais, que larguei o emprego que tanto odiava e que ando com planos de morar só. Acho que você também gostaria de saber que fiz aquela bateria de exames que eu tanto prometia, que voltei a comer salada e me matriculei na academia.
Também queria te contar que eu vou fazer aquela viagem que me prometia desde o ano passado e que terminei todos aqueles livros que você me recomendou. Acho que você até ficaria orgulhoso se eu contasse que a minha vida anda tão calma e que a última confusão em que me meti foi você.
Mas também ando muito curiosa. Queria saber como foi aquele show que você tanto esperou e o que achou daquele livro que te emprestei e você nem chegou a me devolver. Falta você me contar como foi seu médico e se você marcou a terapia. Também quero notícias de a quantas anda aquele seu projeto e como foi aquela sua prova difícil. 
Além disso, muito me interessa saber se você finalmente conseguiu arrumar a bagunça que tomava conta da sua vida e se agora tem um espacinho aí para mim. Eu preciso descobrir se teu coração anda em paz e se ainda bate alguma coisinha por mim.
Mas eu não sei. Nem de você, nem da sua vida, nem mesmo o que fazer de  mim. Porque, sabe, por mais que eu tenha encaminhado minhas estradas e mantido as aparências ainda tem um vazio aqui dentro. Falta alguma coisa, rapaz. Falta você em tudo. Falta nós. 

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Sobre partidas (in)esperadas



Em um daqueles momentos em que você se aninhava em meus braços e que as palavras me fugiam mais fácil pela embriaguez da nossa química, eu te menti que eu não sentia medo. Que eu e a expectativa andávamos sempre muito distantes e que, por tanto, eu estava preparada para qualquer fim repentino. Tudo mentira. Você, deixando-se convencer pela minha ascendência geminiana ou fingindo por comodidade crer em todas aquelas bobagens que eu falava, me afirmou com certo ar de dor que só tinha um medo: que eu gostasse muito de você.
Confesso, nessa hora senti um calafrio e quis jogar limpo contigo, quis te pedir perdão pelo desapego dissimulado e te frustrar dizendo que já era tarde. Que já gostava de você. Muito. Que eu estava arriscando tudo: minha falsa estabilidade emocional, meus pensamentos e, em especial, meu coração. E que por isso eu sentia um medo desesperador. Quis ser ainda mais injusta contigo e te dizer que aquela sua preocupação era boba, que ela não tinha sentido nenhum porque você não iria me machucar de jeito nenhum.
Machucou. Assim como a intensidade com a qual te dedico meu gostar, você me machucou muito. Me apresentou lugares do meu peito que eu desconhecia e dos quais eu fugia há tempos. Teve toda a paciência em me fazer acreditar nesse troço amargo que as pessoas chamam de amor, colocou band-aid’s e mertiolate nas minhas feridas. E quando elas cicatrizaram você me partiu o coração com a sua partida (in)esperada, me deixando sozinha, sem nem mesmo um único motivo para ter raiva de você.
E agora, meu rapaz? Diz para mim: o que eu faço dessa angústia toda? Como é que é lidar com tudo isso? Porque, olha, não faço a mínima ideia. Você pode fazer o favor de me ensinar? 

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Das miopias sentimentais



Você viu minha pose de moça durona e difícil, assim como também viu eu me despir dessa indumentária que não me serve confortavelmente. Viu meu humor ácido de mulher bem resolvida transformar-se em insegurança de menina mimada. Viu minha tranquilidade de falar em público sobre assuntos que saem no jornal, mas também me viu balançar o pé freneticamente antes de dormir e ser tomada por uma crise de ansiedade inexplicável. 
Viu aquela lagrimazinha no canto do olho que rimava com um bico característico do descontentamento se transformar em pranto. Viu o quanto posso ser grosseira se sentir a necessidade de me por na defensiva, mas também me viu sem defesa nenhuma. Viu minha mão estendida pronta a ajudar, mas viu também meu pedido de socorro.
Viu meu riso mais inocente, assim como viu meu lado mais malicioso. Me viu corar de vergonha, do mesmo modo que me viu perdê-la em segundos. Viu meus medos e me viu criar coragem. Viu a personificação da satisfação quando sua mão me acariciava a face, ao mesmo passo que viu a do descontentamento quando você teve de me deixar. 
Viu meus defeitos mais escondidos, a minha entrega dificultosa. Meus sonhos transformados em frases de efeito que não mostrei pra ninguém, além de você. Viu minha regra e minha exceção. Me viu dormir e acordar. Me viu ser menina e mulher. 
Você me viu nua. De roupa e de alma. E depois de tanto ter visto, eu me pergunto: como não conseguiu enxergar o quanto gosto de você?

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Outras tantas letras trancafiadas



Oi, tudo bem?
Sei que tinha aberto uma exceção para minha promessa de não fazer promessas e prometi a mim mesma que nunca mais te mandaria nenhuma mensagem sequer. É que como te contei, cumprir promessas nunca foi meu forte.
Só que não foi à toa não. Estou descumprindo minha jura para comigo mesma porque hoje eu fui ao cinema. Fui assistir aquele filme que eu queria ter assistido contigo e que só pelo trailer sei que você amaria (mas que a covardia me impediu de te convidar). E eu chorei, chorei muito, um choro preso. Impedido de sair dessa vez não pelo orgulho, mas porque eu tinha medo de que se eu chorasse por nós, eu te tiraria de dentro de mim sem conseguir mais por de volta.
Mas voltando para o foco dessa tentativa de diálogo e para o meu objetivo de te fazer entender, vamos ao motivo de eu ter despencando em lágrimas no meio de um cinema lotado. Foi a trilha sonora, pequeno. Foi àquela música do U2 que você me mandou em uma quarta-feira à noite, que me tirou o sentido das coisas, dando uma lógica para aquele sentimento (assim paradoxal mesmo).
Não consegui prestar muita atenção no filme, a música me tomou por completo. Assim como você fez comigo. E eu só consegui continuar a chorar. Só que dessa vez não tinha a tua mão para me acalmar, nem teus olhos mansos a me sussurrar que isso é coisa da vida, que não passa assim depressa, mas que a gente aprende a lidar.
A verdade, pequeno, o real motivo pelo qual eu digito cada letrinha dessa mensagem ridícula é que você ao mesmo tempo em que me roubou a independência, me abriu uma brechinha na janela e mostrou através de um feixezinho que o mundo podia ser um tantinho meu e que não há razão nenhuma para eu não me permitir. Antes de você e desse misto de serenidade e caos que você se faz, eu sabia e queria me virar, rapaz. Só que ultimamente anda tão difícil me cuidar sozinha...
E eu me perco dentro das minhas próprias palavras. Não consigo prosseguir com meu raciocínio, inicialmente tão lógico e perfeito, não só por ser essa a minha especialidade. Mas é que fica meio difícil, quando a organização daquilo que falo disputa lugar com a tua imagem dentro da minha cabeça. Como de feitio meu (e como você já deve estar imaginando e rindo por dentro) eu tenho que dramatizar tudo, então crio uma cena: você com o ar mais lindo do mundo de “não era isso que eu queria para nós”, lendo por cima dos óculos cada letrinha digitada sob um lapso de impulsividade, suspirando e falando no silêncio do teu meditar  que era disso que você tinha medo, de eu gostar demais de você e acabar nesse sentimento unilateral que me toma agora.
E bem aí nesse momento do script, se eu pudesse te tomava nos braços e invertia a posição. Era eu quem ia te consolar e dizer para não se culpar. Assumiria outra vez a posição do meu ascendente, sendo perfeita geminiana, te passando calma e desapego. Lembrando que eu tinha plena consciência do barco em que eu navegava, que eu tinha assumido – desde o primeiro beijo – o risco de ele afundar. Seria a minha vez de te falar, pequeno, que isso é surpresa da vida, que eu ia me refazer e que nós conseguiríamos ser bons amigos.
Três grandes problemas nessa cena final:
a) eu não consigo mentir para você;
b) a alma leonina me faz toda paixão;
c)nós nunca mais seremos somente bons amigos.
Ok, os caracteres da mensagem já estão se encerrando e eu já consigo me recompor. Queria, queria MUITO para falar a verdade, te pedir para repensar e voltar para juntinho de mim. Só que Bono Vox me disse que o amor não é uma coisa fácil e que eu tenho que andar. Para frente.  Mas agora, deixa eu encerrar de verdade, que apagar letra por letra dá um trabalhão.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Das mensagens que nunca enviei

 

Há uns 5 dias atrás eu mantinha o desejo fixo de que você pudesse conhecer uma versão mais tranquila e menos dramática que eu tinha certeza ter me tornado há pouco mais de um mês,  dois quem sabe. 
Eu pensava e me perguntava: se você tivesse conhecido esse outro eu, se eu tivesse sido tão menos dos problemas que eu fui e representei, teria sido diferente?
Eu queria muito acreditar que sim. Mas não teria. Nada ia ter mudado. 
Eu avisei que eu era especialista em afastar pessoas, alertei que eu tinha um dom muito forte em destruir o que eu tinha de bom com elas. Você me disse que não era para eu gostar tanto de você,  que podia ser perigoso. Mas nós dois ignoramos os avisos de quem só queria o bem.  A vida não.  Ela não ignorou, ela foi atenta e certeira. 
Olha, tudo isso não deve fazer o mínimo de sentido. Na verdade, nada que venha da gente tem muito sentindo.  E isso me faz falta. Faz uma falta absurdamente horrorosa porque aprendi que o que dói nessa vida é aquilo que faz sentido.
Hoje me senti tão só no meio de tantas pessoas e só me veio uma pessoa a cabeça,  só você - aos olhos do meu cérebro que não tem nada de racional - parecia capaz de escutar todos os meus medos. E eu tenho tantos...
Mas tudo parece tão distante,  parecemos duas pessoas que conheci há uns anos atrás, tem horas que parece que a gente nem existiu. 
E eu senti um ódio muito grande disso tudo.  Até eu entender de verdade que eu não posso me esquivar dessa coisa toda de sentir,  que eu não controlo, que eu não sou imune. Entendi que por mais expectativas não criadas, promessas não feitas, a gente vai esperar sempre algo do outro alguém. Algo que as vezes é caro demais e que não pode ser exigido. A verdade é que as pessoas vão magoar a gente, mesmo que elas não queiram, menos pior que a gente escolha quem vai deixar essas cicatrizes. 
Eu não "só queria dizer" alguma coisa com isso tudo. Eu queria dizer muito,  queria dizer muito mais do que minhas palavras não relidas são capazes de expressar. E eu entendi também que eu nunca vou conseguir dizer tudo aquilo que preciso.
Agora, só queria poder te ligar, te pedir para vir aqui me dar um abraço, me fazer companhia nessa droga de vida nova que me trouxe tanta coisa boa. Eu tive um lapso do que eu sou de verdade. E sou egoísta o suficiente para querer me sentir compreendida.
Vou sentir vergonha,  vou me arrepender no instante em que eu apertar no botão para enviar e que essas palavras bagunçadas acumularem volume a sua caixa de entrada. Mas alguém me ensinou que o coração tem que ser seguido,  mesmo que o caminho que ele tome naquele segundo destrua a gente.  
Já no fim, como de praxe, não concluo meu raciocínio porque eu me sinto ridícula. E não tem mais você aqui para me dizer que eu não sou. 
E nem vai ter. 
Mas em parte, todo mundo é um pouco, não é?

terça-feira, 7 de julho de 2015

Desencontros



Em uma daquelas nossas noites de devaneios você foi bastante incisivo ao afirmar que queria ter me encontrado  em outro momento da vida. Eu, como de costume,  calei e guardei para mim a certeza de que na minha vida você só encontraria espaço naquele instante. 
Você com o coração carregado de angústia,  sentindo ainda na boca o sangue quente - fruto de um golpe certeiro que a vida te deu, cheio de feridas abertas mas repleto de vontade de viver.  Eu, do outro lado do abraço, compartilhando da mesma ânsia de me embriagar com liberdade,  com o peito ainda tomado por alguns ferimentos,  mas pela primeira vez, com o coração desarmado.
Entende agora? Consegue ver o que a vida fez com a gente?  Não podíamos ter nos encontrado em outro momento,  meu rapaz. Torcer para esbarrarmos por aí em "melhores momentos da vida" seria matar esse amor antes mesmo que ele nascesse,  apagá-lo sem dar possibilidades para que ele fosse escrito.
Eu sei, eu sei. Fica na boca um gostinho de derrota que o clichê gosta de chamar de "quero mais" e que a gente tenta mascarar com um gole de cerveja. Fica aquela angústia no peito.  Aquela raiva da vida e da gente mesmo. Uma frustrações por não ter seguido em frente,  por termos sido covardemente corajosos para não ver aonde podia dar. Bem sei o quanto dói abrir mão de algo sem motivo nenhum.
E aí a gente se consola calados. Dizendo que esse prenúncio mudo de fim é só para não magoar.  A gente fica com o peito cheio de dúvidas, derramando lágrimas feitas de "porquês" no mais barulhento silêncio.
Não nego, queria respostas.  Muitas respostas.  Mesmo que elas me destruíssem. Mas deixa. O orgulho me abraça e me consola. Deita comigo todas as noites e me diz que vamos manter as aparências e ser bons amigos.  A vida me manda engolir o choro e carinhosamente me enche de tapinhas nas costas, zombando de mim e me lembrando que "não foi dessa vez".

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Sobre a fundamentação do amor




A gente não começa amar alguém porque esse tal faz coisas grandiosas. Mas a gente ama porque observou que quando ele faz o pedido para o garçom sempre traz consigo um ‘por favor’ e quando recebe tem sempre um obrigado a espera. Porque quando ele sorri fecha os olhos e se entrega completamente aquele pequeno gesto. A gente começa a amar alguém porque em uma quinta-feira à tarde você pega a pessoa cantarolando bem baixinho aquela música que te fere o coração. Porque quando ele declama um poema a entonação dele é linda. Você ama esse alguém porque ele morde a boca e ri com os olhos quando quer te provocar.
Você ama alguém pela forma como ele passa da segunda para terceira marcha. Pelo modo como foleia um livro, pelos filmes que ele já assistiu, pelas músicas que escuta, pelo olhar por cima dos óculos e pelo gosto em comum pela cerveja. Você ama alguém pelas piadas sem graça, pelo humor sarcástico e pela capacidade que ele tem de te irritar. Pela forma como ele dorme e pelo modo como enrosca os pés aos seus. Pelo bico que faz quando fica zangado, pelas mãos na cintura quando tenta se mostrar surpreso, pela negação que é ao tentar contar uma mentira. Pelo olhar distante que soa triste e misterioso, pela poesia que ele exala. Você ama alguém pelas marcas que o outro carrega, mesmo que você não consiga identifica-las.
Amar outra pessoa não pressupõe muitas coisas. São os detalhes que chamam atenção, é o mínimo que prende. Aquilo que (quase) ninguém percebe é o que apaixona. 

terça-feira, 16 de junho de 2015

Sobre deixar ir




Hoje senti uma vontade tremenda de te ligar. Senti uma vontade quase incontrolável não só porque quando liguei o rádio, às 6 da manhã, ouvi coincidentemente aquela música que você me mostrou quando eu me sentia a pior  pessoa do mundo.  Nem por eu ter feito brownie e ter vontade de deixar um pedaço na tua caixa de correio. Ou por eu ter lido um texto do Gabito que seria ideal para tua entonação perfeita. 
Senti uma vontade desesperadora de ouvir tua voz porque ando sentindo saudades. Com "s" mesmo. Denunciando ser ela, então,  várias.
Ando sentindo uma falta enorme das mensagens inesperadas que queriam saber o paradeiro do meu emocional e de como andava a minha vida, mesmo que a gente tivesse se visto há poucas horas. Ando sentindo saudade das tuas brincadeiras que sempre me tiravam do sério e me deixavam mais leve, do teu sarcasmo e das tuas ironias ácidas.  Sinto falta da tua trilha sonora que se encaixava perfeitamente na minha história. Da liberdade que eu encontrava quando estava presa nos teus braços.  De você em um dia chuvoso e da sua mão apertando a minha para aliviar meu medo pueril de trovões. Do teu riso manso e do teu beijo quente.
Sinto falta dos teus pés esquentando os meus e dos teus "eu gosto de você",  me esquentando o coração.  Sinto falta das tuas teorias meio malucas que quando se misturavam com as minhas mais doidas ainda, resultavam nos melhores planos que o universo já viu. Sinto falta do teu cheiro, do teu cigarro e da tua mania de não tirar os olhos dos meus quando queria me dizer alguma coisa em silêncio. Sinto falta do teu colo e da  proteção que eu sentia quando me jogava nele. Sinto falta dos teus puxões de orelha e do cuidado que eu nunca recebi de ninguém.  Sinto falta dos teus conselhos sobre como tornar a vida mais leve e ter o coração em paz. Sinto falta do modo como você,  sem muito esforço, conseguia deixar minha vida mais leve e meu coração tomado de paz. Sinto falta de te ver ceder e de ceder,  vez por outra.  Sinto falta de me sentir compreendida e incompreendida também.  Da tua companhia para uma cerveja em uma quarta-feira a tarde. De fingir que a ligação às duas da manhã foi puro descuido e traição dessa tal tecnologia. De passar horas selecionando o melhor assunto para te chamar atenção, como quem nada quer. Sinto falta do teu sentimento de indignação por o mundo ser como é e dessa revolução que teu peito grita. Sinto falta do poesia que você sabe ser e do poema bonito que a gente formava quando juntos. Sinto falta até da tua teimosia e do teu orgulho que batiam de frente com a minha birra.
Mas o que me faz mais falta nesse exato minuto é a coragem de te dizer que falta você me faz.
 

terça-feira, 26 de maio de 2015

Das premonições

Às vezes o coração pede coisas bobas e imotivadas das quais não se pode e, por algum motivo, não se consegue fugir. Naquele dia, quando entrei naquele bar que a gente tanto gostava, o meu só pedia para que eu te observasse, para que te olhasse e gravasse cada detalhe do teu rosto, cada traçozinho que eu achava a coisa mais linda do mundo e cada imperfeiçãozinha que fascinava.
Certa vez, alguém disse que algum elemento do meu mapa astral faz de mim um ser intuitivo. Acho que tenho que começar a acreditar de verdade nessas coisas de astrologia. Era só meu peito pedindo para firmar um contrato de tortura com a lembrança.
Me sentei no canto mais escondido e te observei, cansado, fumando rapidamente três cigarros e meio. Acho que te observaria por toda a noite. Mas fui impedida pela minha mania de pontualidade e por um aperto estranho no peito, que me fez querer ser lembrada. Sentei na sua frente e te sorri, recebendo de volta um esboço de felicidade. Eu nunca gostei de pessoas felizes mesmo...
Meu coração apertou mais.
Respirei fundo e quis soltar o costumeiro “tá tudo bem?”. Mas a sua pressa em fazer tudo sempre com calma e cautela foi bem mais rápida. Antes da minha pergunta previsível e do perigo de despertar em você um sentimento de pena, meus ouvidos foram tomados com aquilo que eu temi por tantas vezes e que meu sentir afirmava acreditar, só por pura superstição. Só para que todo aquele pensamento negativo desse sorte ao ser contrariado e cumprisse sua sina de estar sempre errado. Mas não. Dessa vez não.
Você não fugiu dos meus olhos. Para ser coerente com o início do seu discurso, que relatava querer ser uma pessoa decente, pelo menos uma vez na vida, você me encarou da forma mais mansa para dizer a coisa mais dura que eu podia escutar. Disse que eu era boa demais, não para você, mas para mim mesma, para vida. E que por isso, você tinha de ser sincero comigo. Você me disse pausadamente, sem tomar intervalos, sem sequer respirar, que ali era nosso ponto final. Que não era justo aquilo que a gente vivia. Não precisei te dizer nem uma vírgula para que você respondesse as interrogações exclamadas que eu te fiz em silêncio. Você vomitou um monte de coisas, sobre aquilo que é perfeito pros livros, mas bonito demais para ser vivenciado.
Senti o estômago embrulhar e o coração apertar mais ainda. Respirei fundo diversas vezes para segurar as lágrimas que ameaçavam cair e denunciar o desespero que tomava conta de mim. Senti meu corpo se fragmentar, tive a impressão de que estava desmoronando. Vi a muralha de proteção que eu tinha construído em torno de mim se rachar, quebrar inteirinha. Eu quis te falar um monte de coisas. Ah, como eu tinha tanto o que dizer. Mas o orgulho, velho conhecido nosso, me tomou logo, alegando ter a intenção de colar as migalhas de mim.
Você me tocou a mão. Não evitei seu gesto, não levantei abruptamente, nem te esmurrei de raiva. Meu olhar dançou dos teus dedos que me acariciavam em despedida para teus olhos que declaravam matar ali uma culpa que nunca havia existido. Tentei gravar teu cheiro forte e teu ser inconsequente. Te esquecer nunca foi minha intenção.
Você me questionou se eu não tinha nada o que dizer, lembrou como eu preciso me livrar dessa dificuldade de falar. Balancei a cabeça para um lado e para o outro.
Quis te pedir para não ir, para ficar, para me dar mais meia chancizinha. Quis te dizer que eu estava sem chão, por isso não conseguia levantar para ir embora. Quis dizer que eu não queria ir embora, que eu não queria que você fosse embora. Quis dizer que eu não tinha ideia do que ia fazer com todas as músicas que cantavam nosso amor, com todos os poemas que declamavam nossa história, com o gosto da cerveja que lembrava nosso gosto e nem comigo mesma, que parecia nem mais existir.
Mas eu não pedi, eu não disse nada. Dei o rosto para um amigável beijo de despedida e engoli. Engoli junto com a cerveja as palavras que eu nunca falei, uma saudade tremenda e um orgulho ferido. A única coisa que não desceu e que ainda me entala é todo esse gostar de você.

quinta-feira, 21 de maio de 2015


A birra e a raiva que me são características desagradáveis se colocaram pela primeira vez entre a gente. Saí daquela festa sem falar com você, transformando uma coisa banal no maior problema do mundo.
Pensei por dois segundos e meio que você fosse que nem os outros carinhas e que eu tinha que trazer de volta aquele estereótipo de mulher difícil para po der ficar em paz.
É, mas não funcionou!
Você não é que nem os outros, estereótipos não se dão bem comigo e meu coração ficou angustiado demais com o desenrolar da história.
Assim que deitei a cabeça no travesseiro, senti falta da tua mão me transpassando a cintura e da tua respiração mansa me servindo de cantiga de ninar.  Queria te mandar uma mensagem,  te ligar, te roubar para mim ou qualquer outra coisa que afastasse aquele clima chato que nos tomava.  Mas nunca foi minha intenção pular as cercas dos seus limites.
Senti vontade de te dizer isso, como todo o resto que se passa no coração. Como de costume,  criei cenas na minha cabeça, traçando todas as possibilidades possíveis para o que pudesse acontecer caso a coragem me invadisse e eu falasse aquilo que meu coração pede. Por um lado, imaginei a sua carinha linda me dizendo que não tinha acontecido nada e que eu não passava de uma menina boba. Mas por outro, imaginei você me dizendo que as coisas estavam dentro do normal e, por isso, estavam erradas; que o melhor a fazer era a gente se afastar, que talvez eu tivesse razão, que eu não era tudo aquilo que você pensava.
Entre as duas possibilidades, precisa dizer a qual me apeguei?  Você diria que eu preciso esperar mais o melhor das coisas e eu te diria que isso é forma de proteção e que eu só não quero me decepcionar,  melhor se surpreender. Você diria que concorda em partes e usaria do seu dom argumentativo pra me fazer ficar em dúvida e me trazer paz colocando diversas inquietações no meu peito.  Aí eu diria que...
Ah, quer saber?  Acho que perco mais tempo que devia com todas essas especulações.  Mas é que aprender a me jogar sem medo ainda faz parte da minha lista de 'coisas a fazer'.
E aí de tudo que resta, só fica aquele sentimento de que me prestei a mais uma cena ridícula e que não devia desperdiçar tantas oportunidades com essas conjecturas malucas.
E então,  depois de duas horas e quarenta e cinco minutos pensando,  o sono e um riso bobo me tomam. Acho que vou sonhar com você.

terça-feira, 19 de maio de 2015

Dos riscos que se assumem




De todas as coisas que eu quis nessa vida a que eu quis com maior intensidade foi, sem dúvida nenhuma, a sua companhia. De verdade, não preciso de promessas, de compromissos, de responsabilidade ou de futuro dividido. A única coisa que meu desejo pede é você aqui do meu lado, me fazendo rir por todas as besteiras que você diz, me fazendo bater cabeça com as nossas discussões e ideias meio malucas.
Eu não pedi para gostar de gente diferente. Se eu pudesse gostava de gente normalzinha, comum e sem sal. Mas essa sua falta de juízo e nexo me prendem de uma forma que eu não tenho ideia de como e, muito menos, sei se tenho vontade de me libertar.
Depois de passar minut
os ao seu lado e ter ver indo embora, tenho vontade de lhe pedir para dar meia volta e sentar outra vez na minha frente arrancando tudo de bom que tenho dentro de mim. Lógico que não exigiria que abrisse mão dos seus planos e da sua estrada bem encaminhada. Só ia te pedir para conversar mais um pouco comigo, me fazendo pensar que talvez exista algum sentido nisso tudo que a gente chama de vida. 
Sei lá, você me faz querer mudar de ideia e, talvez até ter vontade de seguir em frente. Porque por você vale a pena interromper a leitura do livro mais interessante do mundo, vale a pena sair de casa em um dia frio, vale a pena mudar meu mundo de lugar e passar o resto do dia pensando em como te prender a atenção.
Mas, ao mesmo tempo, eu sei, entendo que você não pode ficar. Afinal de contas, daqui a meia hora você vai ter que sair outra vez da minha vida. E te olhando assim, tão lindo, tão do meu jeito eu lembro que tenho consciência de temporalidade e você já faz parte do meu passado. Você pode até não perceber, mas esse meu olhar – que mais foge, do que se prende ao seu – pede para o seu coração ignorar essa noção e fazer parte pelo menos do meu presente. Queria eu que do futuro. 

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Não sei lidar




Simplesmente, não sei lidar. Eu não sei lidar com gente intolerante, não sei lidar com quem não aceita opinião divergente da sua. Não  sei lidar com gente fria (e nem com o frio também). Não sei lidar com coisa ou momento sem paixão.  Da mesma forma com outro alguém: não sei lidar com quem não é apaixonado - por um ideal, pela outro ou pela vida. 
Não sei lidar com quem só sabe olhar pro próprio umbigo e acha que o mundo gira ao seu redor.  Não sei lidar com gente que não gosta de chocolate. Não sei lidar com muito sal, a não ser que ele esteja concentrado no mar. Não sei lidar com quem não cede a cadeira no ônibus às prioridades. Nem com quem fura fila, com quem faz fila dupla ou nunca para na faixa de pedestre. Não sei lidar com omissão. 
Não sei lidar com falsidade, nem com meio-termos. Não sei lidar com quem não gosta de ler. Não sei lidar com quem não vê graça em Friends. Não sei lidar com gente normal. Não sei lidar com falta de bom humor (mas jamais o confunda com meio para ofender). Não sei lidar com machismo. Não sei lidar com racismo, nem com lgbtfobia. Não sei lidar com opressões. Não sei lidar com ausência da alteridade e nem da sororidade (mesmo quando ela parte de mim). Não sei lidar com gente que odeia Chico Buarque. Na verdade, não sei lidar com quem não gosta de MPB. Não sei lidar com quem odeia tudo, muito menos com aqueles outros que amam tudo. 
Não sei lidar com quem acha que o Brasil está a um passo de ser Cuba, nem com quem pede a volta da ditadura. Não sei lidar com jenipapo. Nem com sentimentos, nem com demonstrações públicas dele. Não sei lidar com elogios. Não sei lidar com falta de tesão. Não sei lidar com a espera. Não sei lidar com quem vê a redução da maioridade penal como solução,  nem com quem diz que "bandido bom é bandido morto". Não sei lidar com a pressão,  nem com a falta de compromisso. Não sei lidar com gente que é feliz 24 horas, 365 dias. Não sei lidar com trovões. Não sei lidar com meus medos. E nem comigo mesma.
Sinto muito, mas eu não consigo lidar.

terça-feira, 21 de abril de 2015

Sobre uma menina boba e a felicidade



Tá certo.  Tudo bem, é hora de eu ser justa com você.  Então, vou começar por parar de te deixar sem algumas respostperguntas feitas com o olhar. Vamos lá. 
Não  é por nada que eu fico aqui mexendo por segundos que mais parecem horas nesse café doce demais. Nem são só pensamentos aleatórios quando meu olhar se prende ao nada e o riso me foge. Tem mais, rapaz. Muito mais aí por trás.
Que pareça só vontade de chamar atenção, melhor para o muro que protege tudo aquilo que me toma verdadeiramente. E quer saber? Antes fosse. Só que tem mais, pequeno, muito mais.
Por trás de tudo isso, tem a insegurança, que sei que você já detectou e que parece não se importar. Mas é que ela se desdobra em um outro tanto de coisas, em algo que talvez nem seja muito maior, mas que me chega aos olhos e ao coração como um gigante bicho papão.  E me deixa assim, amoada e mais chata que o normal.
É que essa insegurança,  meu rapaz, ela é mãe de um dos piores defeitos que trago comigo: o medo de ser feliz. Eu não sei me permitir, é isso. Eu tenho medo, pavor - pra falar a verdade - de sentir o que essa tal de vida pode me oferecer de bom. Aquela prática de "ter o pezinho no chão" sempre me pareceu mais fácil.  Mas não é não...
Não é porque ela me fecha pra mundo, porque ela me afasta daquilo que eu podia ter de bonito, inclusive de você.
A verdade, é que nem sou aquela cilada toda que ameacei que seria.  Me visto de confusão,  mas me faço toda solidão.  Eu não causo ameaça nenhuma, não represento perigo, pode ficar tranquilo.  É que talvez eu ainda seja uma menina. Muito boba, por sinal.

terça-feira, 7 de abril de 2015

Fica


Entre lágrimas sem sentido eu te mandei embora. Pedi chorosamente que você desse meia volta e se retirasse da minha vida. Te alertei sobre a confusão em que você estava se metendo, só que você não me deu bola. Teimoso e cabeça dura - como se entitula e gosta de provar que é - ficou. Ficou ali, enxugando meu pranto e me balançando como quem nina um bebê.
Te pedi outros milhões de vezes que me deixasse,  te provei que eu não valho a pena e que estacionar seu coração bem ali mesmo, na minha vaga, gera multa altíssima e um coração partido em milhões de pedacinhos.   No entanto, você só sabe ser amor.
Mas sabe, passando todo esse alvoroço que não sei bem explicar e vivendo um raro lapso de calmaria, eu te peço: vai não.
Não nego, sou de fato uma roubada das grandes, mas esquece o que eu disse. Sei que isso - como a maioria dos meus atos- deve te deixar confuso,   é só que sempre me pareceu impossível alguém gostar de mim com toda essa mescla de desastre e confusão que me faço.
Estranha não,  é  que ninguém nunca ousou avançar o sinal depois do meu aviso de "Pare.  Eu sou uma cilada"; ninguém nunca foi capaz de suportar meus dramas e colocá-los tão ajustadinhos e aconchegados nas suas preocupações e zelo. Na verdade, sempre fui acostumada a cuidar, ser cuidada me assusta um pouco.
E então?  Ainda dá para ignorar toda aquela besteria que eu falei? Tá, com exceção da parte em que eu confessei gostar de ti, pode apagar tudo. De verdade, diz que sim e senta aqui do meu lado, prometo que vou tentar me comportar.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Ao meu pequeno



Ei, pequeno . Senta aqui. Não me engula com esses olhos. Tenha calma e veste paciência que eu tenho muito que prosear.
Você faz uma ideia errada de mim, me toma como mulher forte e decidida. Mas sou não, pequeno.
Começo me desfazendo do mulher, sou menina. Menina frágil não, mas muito indecisa.
Por que eu finjo assim?
Ah pequeno, é que uma moça chamada vida me mostrou mentiras por verdades. Me ensinou - sem saber-, diga-se de passagem, que sentir não se demonstra, se esconde e se guarda só pra gente.
Sabe, eu até fui metida a rebelde um tempo desse. Contrariei o que essa moça me jogava na cara e me permiti sentir. Eu amei, pequeno. Eu gritei a todo o mundo que o amor era meu. Mas era não...
Era algo transvestido que parecia tanto com sentimento que me levou cair em um abismo quase sem fim. Mas eu me enganei, pequeno. Certa, então, pareceu-me a tal de vida.
Segui os conselhos dela e reprimi, escondi  aquilo que me parecia ser bonito. Eu desaprendi, pequeno. Desaprendi essas coisas do coração. Não sei mais como se faz, pra onde se vai, como se mexe.
E o que você tem com isso? Ah, pequeno, é que eu ando tentando te esconder.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Ainda é você

Porque ainda é você. Ainda é você no meu caminhar sem rumo, no meu olhar perdido e no meu pensar distante. Ainda é você naquela música cantada com todo fervor, no poema recitado cotidianamente feito oração e no meu livro favorito. Ainda é você na cerveja gelada, nas cartas de baralho mal distribuídas e nos bilhetes ligeiramente rabiscados. Ainda é você nas conversas jogadas fora e nas reflexões que me tomam quase todo o tempo. Ainda é você na calmaria do meu quarto escuro e na solidão da noite. Ainda é você quando dou o meu melhor e o meu pior também. Ainda é você quando reconheço meus defeitos e quando me esforço para melhorá-los. Ainda é você quando me sinto extremamente feliz e totalmente destruída. Ainda é você quando vivo a vida intensamente e quando resolvo me entregar às surpresas do destino.
Porque mesmo com a imensa distância que nos separa, ainda é você em cada gesto meu, em cada olhar direcionado a um qualquer e em cada pedaço de mim.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Sobressair


Sabe, eu ainda escrevo e leio textos de amor, mas não tento mais vivê-los. Ainda assisto algumas comédias românticas e até choro com muitas, só não quero mais que sejam o roteiro da minha vida, entendi o quão amargo e maravilhoso é o sabor da realidade. Sim, sim. Eu ainda escuto os mesmos sambas que falam de paixão, mas não danço mais no ritmo deles; agora eu danço ao som do que tocar. Aham, eu ainda choro muitas noites com a cara enfiada no travesseiro, sozinha no escuro, com aquele efeito dramático; mas venho aprendendo a conversar mais, a desmistificar meus monstros mais profundos. Não nego, todos os dias ainda relembro o passado, meio que como uma forma de aprendizado, para não esquecer do que doeu e como eu cheguei naquele estágio patético em que eu me encontrava meses atrás. No entanto, não vivo mais fazendo do meu cotidiano um reviver do que passou, venho injetando presente na veia e estando sempre em um maravilhoso estado de êxtase. Claro, eu ainda gosto do calor - é que ele combina com meu estado de espírito e me amedronta menos - entretanto, já suporto o frio corriqueiro sem a sua presença. O sabor do sorvete permanece o mesmo, ainda não consigo andar calçada, nem tomar o café amargo que acho bonito; nunca me acostumei com o cheiro do cigarro, continuo a ficar bêbada com a mesma facilidade de sempre e meu sono permanece pesado. E falando sobre as coisas das quais nunca fui capaz de me desapegar, chegando mais precisamente até você, não preciso de rodeios. Ainda gosto, quase amo; ainda desejo, penso. E quando penso vez por outra ainda solto um riso torto só de lembrar. Mas não quero mais. Não para mim. Você, quer dizer, nós, viramos aquela lembrança bonita, mas distante demais para alimentar estímulos vitais. Serve só para lembrar mesmo. É, meu rapaz, e eu que não acreditava quando diziam que a gente aprende.